Feriados, para que vos quero?

A suspensão dos feriados, em vigor desde 2013, foi interrompida em 2016 pelo atual Governo, que reavaliou as condições do acordo com a Santa Sé, no caso dos feriados religiosos, e com a concertação social, no caso dos feriados civis. Para os mais radicais, no entanto, a decisão de reposição dos feriados abolidos foi claramente negativa. Uma provocação, uma heresia, uma cratera nas contas públicas, aproveitando a lógica geológica dos buracos, buraquinhos e buracões da “solidez” da banca.
Segundo os apologistas, deixar de trabalhar por um dia equivaleria a uma vertiginosa queda da produção acrescida da perda de uns bons milhões de euros de riqueza que poderia ser gerada e não o era. Decisões destas, num país com baixa produtividade, dívida excessiva, e desemprego elevado, o qual só o crescimento económico (sustentado pelo trabalho e produção) poderia debelar, eram inequivocamente, para estas mentes iluminadas, um passo/maratona atrás.
Além disso, num Estado laico, não fazia sentido algum o país parar por motivos religiosos (recorde-se que dois dos feriados repostos são de cariz religioso). Assim sendo, pouco se perderia, já que o número de religiosos assíduos também só vai infelizmente aumentando nas fileiras do “daesh”.
Conforme chegaram ao cúmulo de “bolsar” os sequazes das suspensões,  quem quiser comemorar festas ou datas religiosas que o faça à parte, sem interferir no andamento da economia e da sociedade como um todo. A separação do Estado e da Igreja já vem desde a Primeira República, razão pela qual já era tempo de o país não ter que parar só para se “louvar” uma divindade na qual nem todos acreditam (e ainda bem) e que ainda por cima mexe com a vida de quem não tem nada a ver com ela. Não era mal pensado. Os não crentes punham-se a caminho do trabalho, os crentes seguiam a sua devoção, e prontinho.
Ora, vejamos, admitindo que o número  de feriados estivesse indexado à produtividade, a Alemanha (que não só tem mais feriados, como mais dias de férias, sendo muito mais produtiva) estaria à beirinha de  pedir um resgate? A Suécia, para irmos mais longe, que está a experimentar 6 horas de carga horária, andará porventura de cabeça perdida?
E que dizer da França, que ao descer para 35 as horas semanais de trabalho, teve como resultado (bem feita!) o aumento de produtividade? Andarão, com toda a certeza, com a “instalação trocada”!!!
É a modos que  aquela mãe que dizia orgulhosamente que só o seu filho é que levava o “passo certo” na marcha do juramento de bandeira…
Posto isto, uma sugestão para os indefectíveis defensores da manutenção dos cortes dos feriados agora repostos é a de que nos referidos dias façam greve aos feriados e cumpram escrupulosamente o seu horário de trabalho acorrentados “ombro a ombro” a ferrolhos, cadeados ou amarrados a cancelas de estacionamento.
E quanto a alguns patrões? Porque não darem o exemplo, abrindo portas, nem que seja para arejar carpetes ou fazer horas extraordinárias… com a “secretária”.
Afinal de contas, qual o português (bem informado) que não sabe que o terem anteriormente surripiado os feriados aumentou exponencialmente a produção? Ou que diminuiu muito significativamente o desemprego, subiu a baixa taxa de natalidade, travou o envelhecimento da população, estancou a emigração ou reduziu o recrudescimento dos suicídios? Ou que a suspensão dos feriados foi, quiçá, o fator mais determinante na descida do défice  e da dívida? Acredito que Medina Carreira, nos seus programas de Apocalipse Now, é homem para ter os gráficos comprovativos, e, melhor ainda, para lê-los só com um piscar de olhos.
Em todo o caso, por que razão acusamos, então, uma quebra no investimento? É simples. Tivéssemos continuado com os cortes nos feriadinhos e, “upa, upa”, o investimento já teria subido em flecha (e, atenção, a expressão “em flecha” é um eufemismo).
A sério, só mesmo aos pafistas lembraria abolir o feriado do dia da implantação da República, num país que diz ser uma República na sua Constituição. “Words, words, words!”
Comemorar um feriado de ditadura capitalista, isso sim,  é que era!!! E que tal um feriado religioso para o neoliberalismo,  mais outro para orar pelos sagrados Mercados, e outro ainda pela Aparição dos Pastorinhos da Troika?
Quanto ao feriado da Restauração da Independência, deixar de comemorá-lo foi uma brilhantíssima homenagem aos nossos “egrégios avós”. A bandeira nacional hasteada por Cavaco Silva, ao contrário, era já um sinal sibilino, oh, se era! Sim, porque Cavaco sempre disse “Eu avisei”.
Ainda assim, o que causa mais perplexidade (ou nem por isso) foi o facto de os mesmos pafistas terem votado na abstenção, exatamente quando se tratou de decidir a reposição ou não dos feriados!!! Incoerência ideológica? Cobardia estratégica ou hipocrisia política?
Então em que é que ficamos? Nem um fogacho de indignação, nem uma manifestaçãozita ou um abanico de cartazes a marcar uma posição político-ideológica. Estariam os “produtivófilos” a fazer uma “siesta”, a aproveitar alguma “ponte” para umas férias na Comporta ou para um passeiozinho ao Dubai?
Pena é que os que costumam dedicar-se ao chicoespertismo/parasitismo para assegurar a sobrevivência e continuidade da sua espécie, contribuindo assim para o descontrolo das contas públicas e para a ruína nacional, nunca façam feriados e dias santos.
Terá sido em razão de esta medida emblemática do Coelhismo/Portasirrevogalismo não ter sido tomada mais cedo que a Economia regrediu mais de dez anos, falharam todos os défices orçamentais e a Dívida soberana aumentou mais de Cinquenta Mil Milhões de euros???
Já agora, que reação teriam americanos ou franceses, entre outros, se lhes fosse negado o dia da sua Independência por um bando de apátridas ou estrangeirados? Imagine-se…
E, por falar em imaginar, imagine-se igualmente a vontade de desatar à bordoada que não teriam os que se bateram e deram a própria vida em nome da nossa independência e soberania nacionais. Quantos Miguéis de Vasconcelos não haveria que virar de cangalhas…

Sem comentários:

“Nem rei nem lei (…) Este fulgor baço da terra / Que é Portugal a entristecer”, já dizia Pessoa

“Nem rei nem lei (…) Este fulgor baço da terra / Que é Portugal a entristecer”, já dizia Pessoa