Os 100 dias de Marcelo

Resultado de imagem para marcelo abraço
Passos Coelho disse que era de evitar eleger um Presidente “cata-vento”, e outros, talvez por dor de cotovelo da energia Duracel (passe a publicidade) de Marcelo, chamaram-no “hiperativo”. Enfim, invejas de quem gostaria de dormir apenas 4 ou 5 horas por noite a ler 3 ou 4 calhamaços.
Não que a alegada “hiperatividade” possa ser desconsiderada. Veja-se quantos pais têm orgulho nos filhos “hiperativos”, incentivando-os mesmo a serem-no todo o santo dia. De manhã, escola; à tarde, explicações e muay thai; à noite, e madrugada fora,  o extenuante face. Ainda assim, sempre é melhor ser “hiperativo” que ser um pastelão. Ainda assim, insisto, mais vale atribuir comendas no 10 de junho a cidadãos anónimos, exemplo de heroísmo e verticalidade, do que a figuras públicas de reputação algo suspeita, para não dizer muito pouco recomendável. Ou seja, Marcelo recuperou o prestígio e a imagem da função presidencial, repondo os níveis de popularidade que a instituição Presidência da República historicamente tinha.
Difícil, difícil, imagino, será escolher jornalistas que se adaptem a um PR “hiperativo”, o que me leva a pensar que talvez não seja má ideia escolher os mais “hiperativos”. Não é por nada. É só porque calculo que muitos dos que o acompanham na “lufa-lufa” estejam já a precisar de sopas e descanso. Presumo que seja menos estafante acompanhar um tanzaniano  numa Maratona no Quilimanjaro, debaixo de 50 graus centígrados…
Durante o período de 100 dias, o chefe de Estado teve nada mais nada menos do que 250 iniciativas, o que perfaz uma média de 2,5 iniciativas diárias para estar, tal como prometeu, “o mais próximo possível das pessoas”, e apenas não esteve em antena 18 dias. Entretanto, já fez sete viagens ao estrangeiro e já tem em preparação mais três, um périplo por Cuba, México e Colômbia, previsto para Outubro.
O que é facto é que o estilo do Presidente pegou de estaca e a sua popularidade não para de subir nas sondagens. Nada surpreendente é a sua disponibilidade para selfies e conversas, viajando de Norte a Sul e cumprimentando, desde o mais modesto funcionário a membros do corpo diplomático, confirmando-se a sua propensão para os afetos, que não para ódios de estimação e ambientes de crispação de cortar à faca de outros tempos e protagonistas.
Na deslocação ao Alentejo que designou de “Portugal Próximo”, Marcelo explicou: “Quando de vez em quando me perguntam – e a comunicação social gosta muito de perguntar – se não há risco de aparecer muitas vezes, eu pergunto: como é que é possível estar próximo, estando distante? Ou se está próximo, ou não se está próximo”. Nada mais esclarecido e esclarecedor. Ossos do ofício de antigo professor. Goste-se ou não, o novo Presidente distingue-se nos programas, no registo ativo e de proximidade com os cidadãos, claramente a anos-luz do seu antecedente: austero, com falta de pilhas, e mais propenso a pantufas e robezinho.
A primeira visita de Marcelo à Região Autónoma da Madeira está marcada para o início de julho, coincidindo com o Dia da Madeira, e estão previstas para este ano novas edições do “Portugal Próximo” em Trás-os-Montes, em julho, e na Beira Interior, mais tarde. Há já quem diga que Cristo pode ter descido à Terra, mas Marcelo está em todo o lado. Porém, apesar de inovar no estilo e desdramatizar o clima político, Marcelo está atento e  não deixou de lançar advertências sobre a evolução económica e até sobre possíveis efeitos das eleições autárquicas. A dúvida que fica é se a prática de falar sobre tudo, e todos os dias, será positiva, podendo correr-se, segundo alguns analistas,  o risco de banalizar demasiado o poder de intervenção do Presidente. Em todo o caso, apoie-se o caso raro e rápido de consensualidade na política nacional ou, inversamente, não se veja a hora do seu fim, há que tomar como positiva a pedagogia da sua intervenção política e cívica, a par da sua proximidade com o cidadão comum e a dessacralização da função presidencial.  Tem plena consciência de que é o primeiro catedrático de Direita eleito por sufrágio direto e universal, o que o obriga a dar o exemplo de um Estado de Direito. Em face do exposto, não nos restam dúvidas de que certamente o fará.

Sem comentários:

“Nem rei nem lei (…) Este fulgor baço da terra / Que é Portugal a entristecer”, já dizia Pessoa

“Nem rei nem lei (…) Este fulgor baço da terra / Que é Portugal a entristecer”, já dizia Pessoa